28/11/2023 - Notícia - Falta
de auditores fiscais dificulta combate ao trabalho escravo
Auditores fiscais do trabalho resgataram, até 21
de novembro deste ano, 2.847 trabalhadores em condição análoga à escravidão e,
até outubro, encontraram 2.064 crianças em trabalho infantil.
O cadastro de empregadores que submeteram trabalhadores a condições análogas à
escravidão, a chamada “lista suja do trabalho escravo” do Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE), somou 472 empresas inscritas até mês.
De janeiro até o último dia 21, os auditores fiscais do trabalho resgataram
2.847 pessoas exploradas em condição análoga à escravidão no Brasil. Além
desses trabalhadores, os auditores encontraram até o mês de outubro 2.064
crianças e adolescentes em trabalho infantil, proibido por lei (Estatuto da
Criança e do Adolescente).
Os números do aproveitamento abusivo da mão de obra no país foram repassados à
Agência Brasil na última sexta-feira (24) pelo MTE. De acordo com as fontes
ouvidas pela reportagem, é provável que esses dados, ainda que superlativos,
subestimem a exploração ilegal da força de trabalho no Brasil. Segundo as
fontes, o quadro de auditores fiscais do trabalho está defasado há anos.
“Se nós tivéssemos o número pleno de auditores fiscais do trabalho, mais
operações possivelmente teriam sido realizadas e mais criminosos infratores
teriam sido incluídos na lista daqueles que cometem a prática e o crime de
trabalho escravo e de submissão ao trabalhador a condições degradantes”, afirma
o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait),
Bob Everson Carvalho Machado.
“Hoje nós temos na ativa 1.917 auditores, de um quadro possível de 3.644”, diz
Machado. “É uma situação gravíssima que, obviamente, impacta em todas as áreas
de atuação da inspeção do trabalho.”
Conforme Machado, a carência tem efeitos negativos em várias atribuições do
MTE. “Impacta, por exemplo, na fiscalização do trabalho escravo. Impacta na
fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista. Impacta na busca por
ambientes de seguros de trabalho, não combatendo assim os acidentes no local de
trabalho. Impacta no combate às piores formas de trabalho infantil. Impacta na
fiscalização do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS),
na inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho e também na
inserção de aprendizes.”
Denúncias não apuradas
A carência de auditores fiscais do MTE é lamentada por procuradores do
Ministério Público do Trabalho (MPT). “Em 2023, já foram mais de 3,5 mil
denúncias que chegaram aos órgãos públicos sobre trabalho em condições análogas
à escravidão. O atual quadro de auditores torna quase impossível, ou
inviabiliza que todas as denúncias sejam fiscalizadas”, reclama o coordenador
nacional de Combate ao Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico no MPT,
Luciano Aragão Santos.
Aragão assinala que o “prejuízo imediato é dos trabalhadores”, inclusive quando
têm direito a benefícios previstos em lei. “O governo concede o
seguro-desemprego especial, em três parcelas, para trabalhadores e
trabalhadoras resgatados. Mas, para essa liberação, é necessário que o auditor
fiscal esteja presente na força-tarefa [que flagra a exploração]. A
alternativa, quando eles não estão presentes, é o MPT ajuizar uma ação para
liberação judicial de seguro-desemprego. Mas, obviamente, é um processo mais
moroso do que a liberação administrativa feita pelo auditor no próprio momento
da fiscalização”, explica.
Segundo Aragão, a ausência de auditores nas forças-tarefas pode deixar impunes
os empregadores que cometem crimes. “Quando o auditor fiscal não participa, o
empregador acaba ficando imune e se livrando de uma série de autos de infração,
e uma série de multas administrativas que incidem.”
Novecentas vagas
O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) anunciou que
900 vagas para auditores fiscais do trabalho serão ofertadas em concurso
público no primeiro trimestre de 2024. Essa será a carreira com mais vagas no
Concurso Nacional Unificado - 13,55% das 6.640 vagas. Como noticiado pela
Agência Brasil, i o edital deve ser publicado em 20 de dezembro.
Na opinião de Aragão, a reposição de 900 auditores “não é suficiente para ter
um quadro ideal de fiscais de trabalho.” O presidente do Sinait concorda e
calcula que seria necessário contratar um total de 1.727 novos auditores. “Nós
temos a expectativa de que, no prazo de validade do concurso, possam ser
chamados os excedentes, aqueles aprovados pelo certame e que estão fora do
número inicial de vagas”, diz Bob Machado.
A natureza das atividades dos auditores fiscais do trabalho é bem capilarizada
nos diversos setores econômicos e em todo território nacional - no meio rural e
no meio urbano, em pequenas cidades e em metrópoles. Assim, a distribuição dos
futuros concursados é um ponto crítico. “O mundo do trabalho está nos rincões
espalhados do Brasil”, pondera Machado, alertando que a má distribuição dos
concursados pode inviabilizar o trabalho dos auditores. “Não é possível
imaginar que um único auditor conseguiria dar conta de toda a profusão de
hospitais, comércios e indústrias de São Paulo”, exemplifica.
De acordo com o secretário de Inspeção do Trabalho do MTE, Luiz Felipe Brandão,
a distribuição dos concursados por estado ainda não foi estabelecida. Um grupo
de técnicos do ministério está mapeando as áreas com maior deficiência de
auditores fiscais e onde se encontram situações mais críticas.
Ele admite que o concurso “não vai repor totalmente” o número de auditores
necessários, mas ressalta que o recrutamento pelo certame “é o primeiro passo
para caminhar nesse sentido.”
De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, o salário inicial de um
auditor fiscal do trabalho é de R$ 21 mil.
Edição: Nádia Franco
Fonte: Agência Brasil ( https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2023-11/falta-de-auditores-fiscais-dificulta-combate-ao-trabalho-escravo